Monday, February 14, 2022

LVDI SCÆNICI: MÚSICA E DANÇA NA ROMA ANTIGA

 

Em 364 a.C., Roma foi assolada por uma terrível peste. Para apaziguar a ira dos deuses, foram criados os LVDI SCÆNICI que apresentavam os “Ludiones” (dançarinos e atores etruscos) que “dançavam ao som de tíbias sem cantar e sem mimar o significado da música, movendo-se, não sem graça, à maneira etrusca” (Livy VII, 2). Este foi o primeiro exemplo de uma performance musical na Roma Antiga, não diretamente ligada a rituais, ao teatro ou ao circo.

O grupo LVDI SCÆNICI foi fundado por Cristina Majnero (Tibia, Kythara, Voz, Syrinx) e Roberto Stanco (Tibia, Lyra, Percussão), que se especializaram nos sons e nos instrumentos da antiga música romana. Enquadraram o grupo Synaulia - que editou dois volumes dedicados à música da Roma Antiga -, e colaboram, entre outros, com o “Museo della Civiltà Romana” (Museu da Civilização Romana) em Roma. Compõem, ainda, o grupo, os músicos Gaetano Delfini (Tuba, Cornu, Percussão) e Daniele Ercoli (Tuba, Percussão e Oblicuum calamum). 

Não foram preservadas quaisquer notações musicais que nos ajudem a reconstituir a música da Roma Antiga, mas há muito material disponível para o estudo da cultura musical desse período. Alguns dos instrumentos musicais da época sobreviveram e, por outro lado, chegaram até nós iconografias, facilmente identificáveis nos documentos dos romanos antigos, de instrumentos de percussão, de sopro, de cordas e até órgãos hidráulicos. Alguns desses instrumentos, como os Tympanum - uma espécie de tambores da Roma Antiga -, entre outros, são ainda hoje usadas ao longo de várias regiões do Mediterrâneo, África e Médio Oriente - testemunho vivo das trocas artísticas e culturais que então ocorriam e continuam a acontecer nos nossos dias.

Há também uma vasta quantidade de imagens das danças na Roma Antiga, disponíveis em cerâmica, frescos e mosaicos, com dançarinos em poses sugestivas típicas da época, muitas vezes representados segurando pequenos instrumentos musicais como cymbala ou crotala. Os LVDI SCÆNICI, como antes os grupos Synaulia e Musica Romana, têm sido capazes de produzir coreografias plausíveis, graças ao grande número de imagens que, em alguns casos são como representações de sequências de dança.

Até à data, os LVDI SCÆNICI editaram os registos E Tempore Emergo (2001), reeditado em 2013 com o título Carpe Diem, Festina Lente (2011) e Meum mel (2017), todos eles dedicados aos “Suoni e Strumenti dell’Antica Roma”. Entretanto, têm atuado em diversos países (Itália, França, Espanha e Suíça, nomeadamente), em anfiteatros romanos e em áreas arqueológicas, contando com diversos músicos e dançarinos, convidados para o efeito, uma vez que, na sua versão concerto, o grupo é composto por cinco músicos e dois bailarinos.

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Saturday, May 29, 2021

Alhambra (EUA) performs Judeo-Spanish Songs

 Alhambra, fundado em 1981 pela mezzo-soprano americana Isabelle Ganz, é um ensemble sediado em Nova York e especializado no repertório sefardita (judaico-espanhol). Até à data, todos os registos editados pelos Alhambra são dedicados à música tradicional sefardita: “The Art of Judeo-Spanish Song” (1988, Global Village Music), “The Joy of Judeo-Spanish Song” (1995, Aulos/Koch/Schwann), “Alhambra Performs Judeo-Spanish Songs” (1997, Global Village Music) e “Tres Clavinas: Judeo-Spanish Songs of Love, Courtship And Holidays” (2019, Centaur Records).

Na cultura judaica peninsular, o acervo sefardita inclui canções para acompanhar cada celebração da vida, desde a aurora ao crepúsculo (o nascimento, o namoro, o noivado, o casamento...). Canções de embalar, de amor, de desilusão ou humorísticas, bem como relatos da vida quotidiana ou epopeias enchiam de prazer festas familiares, casamentos, ou outras celebrações. Numa aliança primordial, a palavra, a música e a dança aliavam-se nas romarias e em festividades, onde jograis e trovadores, cantadeiras e soldadeiras conviviam e partilhavam a alegria e a tristeza, afetos e conflitos, semelhanças e diferenças, ao som de adufes, violas de arco, saltérios, guitarras, sonalhas…

Depois da diáspora, o repertório que conhecemos como música sefardita, com mais de 500 anos de sobrevivência no exílio, chegou até aos nossos dias por transmissão oral. Isso aconteceu, sobretudo, graças, ao empenho das mulheres que, durante séculos, entoaram essas canções quando realizavam as tarefas domésticas, se ocupavam das crianças, preparavam as festas ou consolavam a dor.

Variadíssimos grupos de diversos locais se têm debruçado sobre os tesouros da música sefardita. Usando estilos vocais e instrumentais autênticos, o ensemble Alhambra apresenta nos seus registos temas da tradição judaico-espanhola da Espanha, dos Balcãs e de países do Médio Oriente e do Norte da África, recolhidos por Isabelle Ganz no Centro de Pesquisa de Música Judaica da Universidade Hebraica de Jerusalém e no Sephardic Home for Aged em Brooklyn (Nova York), bem como por vários etnomusicólogos em Israel e nos EUA.


 


Monday, May 3, 2021

Capella de Ministrers - Cantigas de Santa Maria


“Em 23 de novembro de 2021 completam-se 800 anos do nascimento de um dos raros governantes do passado, cuja fama se deve mais ao seu legado intelectual e cultural que ao político: Afonso X, el Sábio (1221-1284), rei de Leão e Castela. A ele se deve o fabuloso espólio conhecido por Cantigas de Santa Maria, constituído por 426 obras dedicadas à Virgem, que, com os preciosos códices nos quais estão conservadas, constituem indubitavelmente um dos maiores monumentos da música europeia de todos os tempos.

Pela sua coerência temática e formal, pela sua homogeneidade estilística, pelo seu número e até pela beleza dos próprios manuscritos que as contêm (alguns deles com luxuosas miniaturas), a coleção de Cantigas de Santa Maria tornou-se num fenómeno particular na história da música medieval e constitui o cancioneiro com mais variedade de temas acerca da Virgem Maria, em toda a Europa. Os textos poéticos, a música e as imagens dos preciosíssimos manuscritos iluminados, nos quais foram transcritos os louvores à Virgem Maria, os seus milagres e trechos de história sacra chegam, assim, até nós, elucidando-nos sobre a cultura e a sensibilidade do homem medieval.

Para comemorar o 800º aniversário do nascimento de Afonso X, bem como o 10º aniversário da Early Music Morella (Curso e festival especializado em música medieval e renascentista) e o Ano Santo Jacobeu 2021 (celebrado desde o século XII), o ensemble Capella de Ministrers editou este ano uma fabulosa interpretação das Cantigas de Santa Maria. Criado em Valência em 1987 com o objetivo de recuperar o património musical espanhol, o ensemble, sob a direção de Carles Magraner, rapidamente se tornou num dos grupos de referência nos domínios da música antiga vocal e instrumental, contando já no seu currículo 63 registos, alguns deles autênticas obras primas.

A participação de cerca de três dezenas de músicos (entre os quais as extraordinárias Mara Aranda e Begoña Olavide), 19 temas instrumentais e vocais e mais de uma hora de música hipnótica fazem de “Cantigas de Santa María, Alfonso X el Sabio” (CDM, 2021) um dos melhores discos editados este ano, até à data. Mais uma vez, Carles Magraner e a Capella de Ministrers resgatam a música antiga como parte essencial e fundamental da memória coletiva e, com mestria, aproximam-na do nosso tempo.”





Friday, February 5, 2021

Mara Aranda, a magia da voz antiga do Mediterrâneo

 Mara Aranda é natural de Valência e, durante três décadas, tem investigado e interpretado as músicas do Mediterrâneo (sul de Espanha, Turquia, Grécia, Marrocos…) e a música antiga, sobretudo a medieval e a sefardita. Alcançou, assim, uma projeção internacional invejável, tornando-se numa das três extraordinárias vozes femininas do Al Andaluz Project. Em nome próprio, deixou vários discos, quase todos merecedores de prémios e de reconhecimento por parte do público e dos meios de comunicação especializados.


      Da sua discografia, destaca-se Dèria (Galileo-mc), a produção de world music espanhola mais destacada de 2009, tendo sido considerado “o melhor disco de músicas do Mundo do ano”, pela UFi nos Prémios da Música Independente, por votação popular; também o melhor disco pelo programa “Hidrògen”, para a Icat FM; TOP 10 na lista anual da World Music Charts Europe durante 4 meses consecutivos e o único grupo espanhol nos 10 primeiros lugares do resumo anual da lista, além de melhor disco de folk nos prémios Ovidi Monllor de 2009 e, ainda, nomeado, para os prémios de “melhor letra” e “melhores arranjos”.

Com Lo testament” (Bureo Músiques, 2013) Mara Aranda continuaria a linha de trabalho clara e contundente que se iniciara com ‘Dèria’, arrecadando o prémio Ovidi Monllor de “Melhor disco folk do ano”, poucas horas depois do seu lançamento.

Em 2015, Mara celebra os seus 25 anos de carreira com o disco Mare Vostrum, dedicado ao espaço cultural do Mediterrâneo, fonte de inspiração em toda a sua produção literária e musical, sendo galardoado como “Melhor disco folk do ano”.

Como investigadora e intérprete de música sefardita, Mara Aranda tem realizado viagens de residência para a investigação e estudo da dita tradição em Salónica (2003-2004) e Istambul (2006-2007), sendo resultado deste exercício a edição de “Músiques i cants dels jueus sefardis” (Galileo-mc, 2005) e “Sephardic Legacy” (Bureo Músiques, 2011). Em 2014, edita “Música encerrada”, acompanhada pela Capella de Ministrers, de Carles Magraner.

Em 2017 tem lugar o início do lançamento da sua obra mais completa, uma coleção composta por cinco discos dedicados às principais geografias da diáspora. O primeiro volume, intitula-se Sefarad en el corazón de Marruecos, considerado o “melhor disco europeu do ano” e o 9º do ranking mundial, pela Transglobal World Music List. O segundo volume, Sefarad en el corazón de Turquía, de 2019, recebeu, também, o galardão de “melhor disco europeu do ano”, ficando na 5ª posição de toda a produção mundial desse ano. Seguir-se-ão, sucessivamente, os dedicados à Grécia, Bulgária e antiga Jugoslávia.

Em 2020, Mara Aranda celebra os seus 30 anos de carreira profissional com o fabuloso disco Trobairitz”. Acompanhada pelo talento de quatro instrumentistas femininas, interpreta textos originais dos séculos XII e XIII de trovadoras medievais, as conhecidas trobairitz, bem como outros de que se não conhece o autor, não se descartando, naturalmente, a autoria de mulheres, com parte ativa na vida cultural e literária do sul da França, onde o occitano era a língua veicular da poesia.


 


Wednesday, December 30, 2020

Constantinople (Canadá/Irão/…) & Ablaye Cissoko (Senegal)

 

O ensemble Constantinople, fundado em Montreal (Canadá) em 1998 pelo iraniano Kiya Tabassian, consagrou-se na utilização de uma linguagem única e de uma visão nova e criativa face à interpretação das músicas tradicionais, bem como das da Idade Média e do Renascimento. O trabalho de recolha do grupo baseou-se num cuidadoso estudo dos manuscritos históricos e na sua aproximação à tradição oral do Próximo e do Médio Oriente, nomeadamente à clássica persa. Assim, os Constantinople debruçam-se sobre uma “fertilização cruzada” entre as diversas culturas musicais, sobretudo das áreas à volta do Mediterrâneo, nomeadamente a judaica, a árabe, a persa e a cristã. Para o efeito, convidam para as suas gravações uma grande quantidade de músicos de geografias diferentes, entre as quais se salientam os cantores Marco Beasley, Françoise Atlan, Savina Yannatou e Suzie LeBlanc; o griot Mandinka Ablaye Cissoko; o ensemble grego En Chordais, o duo belga Belem e o grupo americano The Klezmatics; o virtuoso do sarangi Dhruba Ghosh, o clarinetista e compositor sírio Kinan Azmeh e o mestre iraniano do kamancheh, Kayhan Kalhor. Naturalmente que os Constantinople se servem, também, de uma panóplia de instrumentos antigos, como o alaúde, a vihuela, a harpa medieval, a viola da gamba e a vièle, entre outros, bem como de instrumentos orientais, tais como o tombak, o daf, o santour, o oud, o setar (instrumento de cordas de origem persa) e o dayereh (espécie de tambor persa).

No destaque que hoje aqui fazemos, importa-nos salientar a colaboração dos Constantinople com o músico senegalês Ablaye Cissoko, exímio tocador de kora, que descende dos gritos Mandinka. Dessa fértil colaboração, nasceram os álbuns “Jardins Migrateurs” (2015) e “Traversées” (2018), editados pela etiqueta Ma Case.

Nesses projetos, os Constantinople & Ablaye Cissoko cultivam uma comunhão espiritual em que as linhagens persas envolvem subtilmente elementos clássicos do Ocidente e tradicionais da África Ocidental. Mas, ao contrário de tantos projetos de “fusão global”, “Jardins” e “Traversées” estabelecem um território verdadeiramente novo, decididamente o seu próprio, sem pretensiosismos ou preconceitos, convidando os ouvintes a participar numa viagem musical hipnótica, propícia ao sublime. Viola da gamba e percussão sustentam a kora, o setar e a voz e, numa simplicidade desarmante, promovem uma troca que evoca uma beleza sonora incomensurável.

Saturday, December 26, 2020

Malandança (Galiza) - “Mya Senhor Velida: Medieval Lais & Cantigas from France & Spain” (2018 Brilliant Classics)

 O grupo Malandança, especializado na música medieval, foi fundado na Galiza (Espanha), em 2000, a partir da proposta de Francisco Luengo, o diretor da banda, que decidiu contactar vários músicos que conhecia para fazer um concerto de música medieval, sem saber se essa iniciativa teria ou não continuação.


Constituídos por seis elementos, os Malandança cantam, contam e tocam guitarra mourisca, cítola, harpa, violas e várias percussões. As réplicas que utilizam foram construídas sobretudo por Luengo, a partir dos instrumentos representados no Pórtico da Glória da Catedral de Santiago de Compostela (século XII) e das esculturas da Sé capitular do Pazo de Xelmírez (século XIII), à exceção da guitarra mourisca, que foi feita a partir de uma das miniaturas presentes no Códice b. 1.2, do mosteiro do Escorial.

Em 2001, os Malandança editaram o disco Unha noite na corte do Rei Alfonso (Clave Records), gravado na Igreja de Santa Maria de Viceso (Galiza), no qual constam sete Cantigas de Santa Maria. Fazendo parte de uma coleção de 426 obras dedicadas à Virgem, estas cantigas foram escritas em galaico-português na segunda metade do século XIII, por volta de 1250-80, sob a direção do então rei de Castela, Afonso X, o Sábio (1221-1284). 

Em 2018, os Malandança editaram Mya Senhor Velida: Medieval Lais & Cantigas from France & Spain (Brilliant Classics), gravado na Igreja de San Fins de Brión (Corunha). Nele constam mais três Cantigas de Santa Maria (200, 421 e 340), mas também duas longas “lais”, originárias da França medieval. Em comum, o facto de partilharem a nova ideia que surge na poesia trovadoresca: o amor cortês; amor que abraça o profano e o divino, o carnal e o místico. Se no carnal há uma senhora nobre que causa sofrimento ao poeta, no místico exalta-se a Virgem Maria. Completa o disco uma antífona do Ofertório, cantada na festa de Maria Mediatrix. Este papel de mediadora é, aos olhos medievais, a principal função da Virgem Maria.”

Sunday, October 22, 2017

Ensemble Resonet – Cantiga: Trobadores de Galiza e Portugal (s. XIII-XIV) (2016, GAUDIA)




       O agrupamento vocal e instrumental Resonet (designação retirada da peça “Vox nostra resonet” do Codex Calixtinus, do século XII), é um ensemble criado em Santiago de Compostela, em 1990, pelo conceituado músico espanhol Fernando Reyes (direção musical, cítola, alaúde, cistro, guitarra barroca e setar). De formação variável, o grupo integra, para o projeto "Cantiga", de 2016, Mercedes Hernández (canto e percussão), Paulo González (flauta, sanfona e gaita) e Carlos Castro (saltério e percussão), tal como Reyes, especialistas na interpretação da música antiga. 
Para além de Cantiga” (Trovadores da Galiza e Portugal dos séculos XIII e XIV), fazem parte da discografia do Ensemble Resonet os registos “La Grande Chanson” (Canções dos peregrinos franceses do século XVII), “Santiago!” (Música e peregrinações no Renascimento), “Les Pellerines” (A moda da peregrinação em França no século XVII), “Il Pellegrino” (A viagem de Cosme III de Medici, em 1668), “Canto de Nadal” (Temas de Natal da Galiza), “Cantares Galegos” (Poemas de Rosalía de Castro, do século XIX), “Canto de Ultreia” (Cantos de peregrinos no século XII), “Festa Dies” (Músicas para a consagração da Catedral de Santiago, em 1211) e “A Peregrina” (Cantos e romances nos caminhos de Santiago).
Exclusivamente dedicado ao repertório trovadoresco galaico-português, Cantiga”, o registo que aqui destacamos, foi gravado em dezembro de 2015, na Igreja Românica de São Pedro de Rates, na Póvoa de Varzim, sendo o disco oficialmente apresentado ao público em julho de 2016, numa sessão que antecedeu o brilhante concerto realizado nesse mesmo espaço, no âmbito do 38º Festival Internacional de Música da Póvoa de Varzim.
As vinte e uma faixas de “Cantiga” consistem maioritariamente em propostas de reabilitação musical da tradição trovadoresca cuja música se desconhece. Excetuando as seis Cantigas de Amigo do jogral galego Martim Codax (das sete incluídas no Pergamiño Vindel, datado de finais do séc. XIII) e uma das sete do rei D. Dinis (incluídas no Pergamiño Sharrer, descoberto no Arquivo da Torre do Tombo), que chegaram até nós com música, as restantes faixas do disco são recriações musicais sobre poesia (cuja música não foi notada ou se perdeu) de diversos trovadores e jograis galegos e portugueses medievais, nomeadamente Afonso Sanchez (filho bastardo de D. Dinis e figura central da corte portuguesa), Roi Fernandiz de Santiago e Airas Nunez (clérigos galegos ligados à corte castelhana de D. Afonso X, o Sábio), Pai Gomez Charinho (nobre galego ligado à corte castelhana de D. Sancho IV), Mendinho (jogral galego de quem nos chegou apenas a extraordinária Cantiga de Amigo "Sedia-m' eu na ermida de San Simión"), entre outros.
O processo de recriação musical encetado pelos Resonet, em “Cantiga”, baseou-se em duas estratégias principais: por um lado a improvisação, “tendo em conta os modos, os ritmos e o estilo da época” e, por outro, a prática da “contrafacta”, isto é, da aplicação da melodia de uma cantiga numa outra, habitual na Idade Média. A maior parte das melodias que serviram de ponto de partida à contrafacta são retiradas das Cantigas de Santa Maria (coletânea com 426 cantigas com notação musical, realizada no século XIII, na corte do rei de Castela, D. Afonso X, o Sábio) e do Codex Calixtinus (manuscrito relacionado com o culto e as peregrinações jacobeias e que inclui melodias gregorianas e música polifónica).
Sobre as possíveis formas de tocar os instrumentos, o ensemble Resonet baseou-se na iconografia musical medieval (nomeadamente nas iluminuras do Cancioneiro da Ajuda). Por outro lado, os intérpretes basearam-se, também, nas formas de execução sugeridas pela morfologia e pelas características acústicas dos próprios instrumentos musicais, procurando, deste modo, ir ao encontro das eventuais formas de execução instrumental na Idade Média. 
        De um modo geral, "Cantiga" revela-se um registo de altíssima qualidade musical e de incontornável valor cultural, por um lado, por resultar de um digno esforço de reabilitação do património galaico-português e, por outro lado, por apresentar um conjunto de abordagens interpretativas e de combinações instrumentais absolutamente fabulosas.