O agrupamento vocal e instrumental Resonet (designação retirada da peça “Vox nostra resonet” do Codex Calixtinus, do século XII), é um ensemble criado em Santiago de Compostela, em 1990, pelo conceituado músico espanhol Fernando Reyes (direção musical, cítola, alaúde, cistro, guitarra barroca e setar). De formação variável, o grupo integra, para o projeto "Cantiga", de 2016, Mercedes Hernández (canto e percussão), Paulo González (flauta, sanfona e gaita) e Carlos Castro (saltério e percussão), tal como Reyes, especialistas na interpretação da música antiga.
Para além de “Cantiga” (Trovadores da Galiza e Portugal dos séculos XIII e XIV), fazem parte da discografia do Ensemble Resonet os registos “La Grande Chanson” (Canções dos
peregrinos franceses do século XVII), “Santiago!”
(Música e peregrinações no Renascimento), “Les Pellerines” (A moda da peregrinação em França no século XVII), “Il Pellegrino” (A viagem de Cosme III
de Medici, em 1668), “Canto de Nadal”
(Temas de Natal da Galiza), “Cantares Galegos”
(Poemas de Rosalía de Castro, do século XIX), “Canto de Ultreia” (Cantos de peregrinos no século XII), “Festa Dies” (Músicas para a consagração da Catedral de Santiago,
em 1211) e “A Peregrina” (Cantos e
romances nos caminhos de Santiago).
Exclusivamente dedicado ao repertório trovadoresco galaico-português, “Cantiga”, o registo que aqui destacamos, foi
gravado
em dezembro de 2015, na Igreja Românica de São Pedro de Rates, na Póvoa de Varzim, sendo o disco oficialmente apresentado ao público em julho de 2016,
numa sessão que antecedeu o brilhante concerto realizado nesse mesmo espaço, no
âmbito do 38º Festival Internacional de Música da Póvoa de Varzim.
As vinte e uma faixas de “Cantiga” consistem maioritariamente em propostas de reabilitação
musical da tradição trovadoresca cuja música se desconhece. Excetuando
as seis Cantigas de Amigo do jogral
galego Martim Codax (das sete incluídas no Pergamiño Vindel, datado de finais do séc. XIII) e uma das sete do
rei D. Dinis (incluídas no Pergamiño Sharrer, descoberto no Arquivo da Torre do Tombo), que chegaram até nós com música, as restantes faixas do disco são
recriações musicais sobre poesia (cuja música não foi notada ou se perdeu) de
diversos trovadores e jograis galegos e portugueses medievais, nomeadamente Afonso Sanchez (filho bastardo de D. Dinis e figura central da
corte portuguesa), Roi Fernandiz de Santiago e Airas Nunez (clérigos galegos
ligados à corte castelhana de D. Afonso X, o Sábio), Pai Gomez Charinho (nobre
galego ligado à corte castelhana de D. Sancho IV), Mendinho (jogral galego de
quem nos chegou apenas a extraordinária Cantiga de Amigo "Sedia-m' eu na ermida de San Simión"), entre outros.
O processo de recriação musical encetado pelos Resonet, em “Cantiga”, baseou-se em
duas estratégias principais: por um lado a improvisação, “tendo em conta os
modos, os ritmos e o estilo da época” e, por outro, a prática da “contrafacta”,
isto é, da aplicação da melodia de uma cantiga
numa outra, habitual na Idade Média. A maior parte das melodias que serviram de
ponto de partida à contrafacta são retiradas das Cantigas de Santa Maria (coletânea com 426 cantigas com notação musical, realizada no
século XIII, na corte do rei de Castela, D. Afonso X, o Sábio) e do Codex Calixtinus (manuscrito relacionado
com o culto e as peregrinações jacobeias e que inclui melodias gregorianas e música
polifónica).
Sobre as possíveis formas de tocar os instrumentos, o
ensemble Resonet baseou-se na
iconografia musical medieval (nomeadamente nas iluminuras do Cancioneiro da Ajuda). Por outro lado, os intérpretes basearam-se, também, nas formas de
execução sugeridas pela morfologia e pelas características acústicas dos
próprios instrumentos musicais, procurando, deste modo, ir ao encontro das eventuais formas de execução instrumental na Idade Média.
De um modo geral, "Cantiga" revela-se um registo de altíssima qualidade musical e de incontornável valor cultural, por um lado, por resultar de um digno esforço de reabilitação do património galaico-português e, por outro lado, por apresentar um conjunto de abordagens interpretativas e de combinações instrumentais absolutamente fabulosas.
De um modo geral, "Cantiga" revela-se um registo de altíssima qualidade musical e de incontornável valor cultural, por um lado, por resultar de um digno esforço de reabilitação do património galaico-português e, por outro lado, por apresentar um conjunto de abordagens interpretativas e de combinações instrumentais absolutamente fabulosas.
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